sábado, 13 de agosto de 2016

Carta de um pai aflito

Queridos filhos:

Amanhã é o Dia dos Pais, e deverei receber presentes de vocês. Não posso fazer exigências, pois reconheço que não sou um pai exemplar (mas quem o é?). Às vezes fico muito tempo ausente e não posso lhes dar a atenção devida; noutras ocasiões me torno excessivo, ralhando e até batendo (uns tapinhas moderados, é verdade, que procuram mais corrigir do que castigar. Nunca ninguém aqui precisou apelar para a Lei da Palmada).  Enfim, esse é o meu papel. Espero que me compreendam e perdoem.
O que pretendo por meio desta cartinha, se me permitem, é fazer um pedido a respeito do que vão me dar. Sei que a boa vontade de vocês é grande, e a grana é curta (mesmo porque sou um tanto avaro nas mesadas), mas com esforço e alguma imaginação é possível fugir ao comum em todos esses anos. Cuecas, por exemplo. Trata-se inegavelmente de um artefato útil, higiênico e necessário – mas já notaram como eu tenho uma porção delas, a maioria ganha justamente no Dia dos Pais? Pensei até em mudar o nome dessa data para Dia das Cuecas. Abram minha gaveta e vejam vocês mesmos. Eu não usaria o que está ali nem que vivesse tanto quanto Matusalém (e olhem que o meu velho corpo já apresenta algumas avarias!).
E meias?! Nada contra meias, pelo contrário: gosto sobretudo quando elas combinam com os sapatos (embora nem sempre os dois entrem em acordo). Até me recusei, quando era jovem, a usar sapatos sem meias embora isso na época fosse um sinal de rebeldia e eu me achasse um rebelde. Esqueçam as meias. E também os desodorantes. Já ganhei tantos, que pensei que vocês estivessem me mandando um recado. Talvez achassem que eu cheirava mal e, por delicadeza, quisessem que eu percebesse isso de forma indireta; daí me presentearem com frascos e tubos de desodorantes (alguns, perdoem-me a franqueza, tão ruins que só fariam piorar a inhaca).   
Não tenho propostas concretas. Tudo que eu quero é que usem um pouco de imaginação e variem as escolhas. Se vierem com cuecas, meias ou desodorantes eu não recusarei, claro. Apenas ficarei triste e com mais problemas para resolver. Onde ia colocar esses objetos? Eu teria que transferir a incumbência à mãe de vocês, que iria ralhar comigo e me chamar de ingrato (esquecendo-se dos presentes que ganha, bem mais interessantes do que os meus. Mas entendo; afinal, mãe é mãe).
Espero que essa carta os sensibilize. Para terminar, um último pedido: não precisa me dar coisas caras, pois sei bem de onde sai o dinheiro para pagar a fatura. Pesquisando um pouco, é possível comprar bons presentes pelo preço daqueles que vocês costumam me ofertar. Ou será que não?
Um beijo deste pai que os ama.




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A esquecida